fragmentos do trabalho de João Castilho

quinta-feira, 11 de abril de 2013

primeiro exercício de escrita do projeto


            Fatos e situações que por coincidência ou não, se repetem num mesmo espaço: a barca. A barca é da antiga e gira para seguir seu destino, deixando o rastro no caminho, que risca o mar preto com a espuma branca e o céu branco com a fumaça preta. Tudo nela conduz ao passado; das cadeiras azuis ''reformadas'' com os braços de madeira, que, descascando, denunciam a ruína, até as janelas guilhotinas, tão generosas com a brisa que invade.

A barca é por essência transição, caminha do passado para o futuro e apesar de sua estrutura concreta, aceita a instabilidade da água: se desloca à deriva no meio do caminho, entre a origem e o destino. Uma cidade que já virou ruína tem uma construção viva, nadando na baia de lá para cá.

 A peça acontece na medida em que quatro personagens (Inês, Rory, Ana e ele) se reconhecem no meio da multidão característica de lugares de transição, e passam a buscar sentido próprio nos encontros circunstanciais, na percepção do outro. Inês, Rory, Ana e ele são seduzidos pelas pequenas coisas desse pequeno trajeto e assumem um olhar particular. Um homem e três mulheres. Três mulheres e um homem. Quatro pessoas. Quatro possibilidades de trajetória. O tempo é o percurso, a espera. O espaço é a barca. A ação é o encontro.

O ínicio da dramaturgia é marcado pela obsessão do personagem masculino em construir uma história com três mulheres que percebe num dia de viajem de barca. A partir desse pontapé, dessa percepção inicial, os encontros e reencontros das mesmas pessoas constroem a ficção.

No meio da dispersão do cotidiano metropolitano o encontro, acaso ou coincidência, necessita de um sentido individual e próprio. O individuo entra num processo de espiral na tentativa de entrar no próprio umbigo de certezas.  O processo de espiral acontece nas personagens obsessivas por sentido, que depositam expectativas e desejos em objetos aleatórios, e na dramaturgia que como uma bola de neve, acumula até explodir. O jogo é somar os fatos, transbordar os sentidos e nunca (ou quase nunca) sair do superficial.

Nenhum comentário:

Postar um comentário