fragmentos do trabalho de João Castilho

quinta-feira, 28 de fevereiro de 2013

terça-feira, 26 de fevereiro de 2013

Os quatro em um e um em quatro.

Ela ERA ruiva e tinha sapatos enormes mesmo com o pé bem pequenininho e é engraçado quando dorme porque fala francês e tem cheiro de maçã verde. Limpa tudo até o seus grandes sapatos. Ela as vezes é homem e sorri para inês de um jeito tímido. Antes de ser albina se jogou no mar e por isso perdeu toda a cor. É ela/ele que inventa história e as conta, controla e enjoa facilmente na barca. Ele não consegue sair da barca e por isso não escuta. Não escuta e nem sente mais o cheiro de maçã  que fica. Ela não consegue sair por causa dos sapatos que são grandes demais e faz tudo o que dá vontade para conseguir dormir e lembrar do francês.

Para o homem sobre Ana.

Opaa! Perdão,desculpas,me perdoa. Sério. Juro que vou sumir... Enquanto espero ficarei aqui tão quietinha que ninguém perceberá  minha existência. Nem mesmo eu. Então pare com essa mania irritante de ficar contando os meus gestos. Não é pra você nem ninguém me perceber, tocar ou mesmo ficar nessa tentativa inútil de salvar minhas palavras que vão caindo nesse abismo inacessível. Por isso prefiro me esconder atrás dessas metáforas. Eu sei que a gente nem se conhece mas eu precisava te fazer uma proposta que eu comecei a elaborar nos últimos minutos: Ao invés de ficar explanando a minha semi-inexistência fracassada , porque não me faz metáfora e pronto?. Não somos nós criação da sua cabeça? Não é você que tem o controle de tudo isso? É só inventar. Você é o dono do controle. Me reinventa metáfora e estará tudo resolvido. Eu sei que não vai me atender. Então pare de me olhar assim. Olhe para ela, que dança, ri e não tem medo de nada. Eu tenho. De gente. Aliás, ela faz questão de existir, dela não dá pra fugir, pois , mesmo se a gente fecha os olhos assim ó, dá pra sentir o cheiro da maçã verde que exala de seu corpo e que espalha por todo o espaço. Ela é a maçã, o espaço e a barca, tudo isso ao mesmo tempo. Não se pode duvidar que se chama Ana. E Ana só pode ser. A sua abundância de existência transborda em si e isso a faz com que exista menos. Queria existir menos. Queria ser Ana. Todos querem. E é por isso que a sua forma de limpar incomoda tanto. Ana existe menos e mais. Veja bem, meu nome aponta algo que não existe em mim e não adianta inventar histórias. EU NÃO TENHO CABELOS VERMELHOS, OK? E nunca tive. Por isso vivo do presente. Ele costuma passar muito rápido e as pessoas o esquecem com facilidade. Então beijarei meu umbigo porque se não faço...ah, você sabe... não durmo e fica cada vez mais difícil porque você descreve até os meus sonhos e não dá mais para fechar os olhos e pensar em outra coisa que não seja maçã.

tem alguém aí?

O SUPERVISOR/SEGURANÇA, FIGURA DA "ORDEM" QUE NÃO EXISTE, NÃO APARECE.

domingo, 24 de fevereiro de 2013

Memória em forma de grito

Uma senhora, fortaleza, cabelos grisalhos, cochila na barca, logo no início da viagem de travessia Praça Arariboia-Praça XV. Assim que entra em seu primeiro sono, ouve-se a fala que irrompe o espaço, calando pessoas, máquinas e até o mar.

- PEDI PARA PREPARAR O SUCO DE CAJÚ E NÃO ADIANTOU NADA!!!

sábado, 23 de fevereiro de 2013

Revolta das Barcas- ruína



Revolta das Barcas foi um levante popular, ocorrido em 22 de Maio de 1959 contra o serviço hidroviário na cidade de Niterói, estado do Rio de Janeiro. A revolta, além de 6 mortos e 118 feridos, resultou na depredação e incêndio tanto do patrimônio das barcas quanto da residência da família de empresários que administravam o serviço (o Grupo Carreteiro), e terminou com intervenção federal e estatização das barcas.






Contexto histórico

À época, bem antes da existência da Ponte Rio-Niterói, o único serviço de transporte entre Niterói (então capital do estado) e Rio (então capital do Brasil) eram as barcas, que levavam aproximadamente 100 mil passageiros por dia (quase metade da população niteroiense de então).
O Grupo Carreteiro, que controlava o serviço, solicitava constantemente apoio financeiro do governo para cobrir os gastos, alegando prejuízo. Porém, o governo negava maiores subsídios sob a acusação do Grupo prestar falsas informações sobre seus gastos, com fortes suspeitas de que a empresa gastava menos da metade do que exigia - suspeitas reforçadas pelas aquisições de fazendas e outros tipos de propriedades pela família Carreteiro, fatos notados pela população.
Somado a isso, as mobilizações sindicais no Brasil que incentivavam trabalhadores e trabalhadoras a se organizar eram crescentes, entre elas o Sindicato dos Marítimos e Operários Navais, que com freqüência paralisava o trabalho - paralisações que eram usadas pelo Grupo Carreteiro como justificativa para novos aumentos tarifários.


A greve dos marítimos

Na noite do dia 21 de maio de 1959, o sindicato entrou em greve, de surpresa, mais uma vez, reivindicando melhores condições de trabalho e organização para os cerca de 4 mil funcionários da empresa.
Com a greve, as Forças Armadas foram encarregadas de administrar provisoriamente as viagens entre Niterói e o Rio, desde a condução até a organização das filas. Foram utilizadas duas embarcações especiais para tal, denominadas "avisos", que, porém, tinham capacidade reduzida.



A revolta

Com o serviço reduzido e logicamente sem dar vazão à demanda, a população começou a se aglomerar na Praça Araribóia, e o desconforto e o atraso foram aumentando a tensão local. Para piorar, os fuzileiros navais que tentavam "organizar" a fila (então um grande aglomerado) começaram a agir com truculência, aumentando o descontentamento e a agitação.Quando um dos militares resolveu dar coronhadas nos passageiros, uma pedra foi lançada contra uma vidraça das barcas, e a resposta dos fuzileiros foi uma rajada de tiros para o alto, o estopim da fúria popular.

Iniciou-se um quebra-quebra pela estação das barcas, que foi incendiada e teve a frota destruída. Os móveis da estação e pedaços das embarcações foram arremessados na rua e incendiados. A revolta seguiu, com a população em marcha para a Rua São João, onde ficava o escritório da empresa, igualmente invadido, destruído, com papéis e moveis sendo arremessados da janela e ateados em chamas.
Por fim, uma marcha em direção à residência dos Carreteiro no bairro Fonseca, a três quilômetros do foco da revolta. A casa foi incendiada, os pertences, destruídos, e os móveis caros, arremessados do telhado. No fim, encontrou-se escrito em uma parede: "aqui jaz as fortunas do Grupo Carreteiro, acumuladas com o sacrifício do povo."


No dia seguinte, a situação já estava sob controle, e o governo brasileiro assumiu o controle das barcas, estatizadas.
A revolta, o vandalismo e a luta entre populares e militares resultaram em 6 mortos e 118 feridos. Alguns periódicos compararam o episódio chamando Niterói de "uma pequena Bastilha".


http://www.labhoi.uff.br/image/tid/80

http://pt.wikipedia.org/wiki/Revolta_das_Barcas

Ponto de retorno

''E Inês, está de Salto? É ela, então, que tenta se jogar e é segurada por um jovem que diz que vai junto se ela for? Eles se apaixonaram mesmo ou foi coisa da televisão? Não sei, posso ter sonhado também... Mas me lembro dela.''

domingo, 17 de fevereiro de 2013

Agora eu quero falar com vocês três.

- Sentem aí, por favor. Uma ao lado da outra. Isso... Primeiro Inês; Rory no meio para não dar briga; depois Ana. Agora me digam: o que é que vocês estão querendo de mim? Calma! Calminha! Uma de cada vez! Primeiro Ana que tem uma opinião mais distanciada, depois Rory com sua análise dançante e açucarada, e por último você, Inês, sua apaixonada. (As três se olham, desistem de falar e retornam o olhar para ele) Eu não posso mais equilibrar essa situação. Preciso assumir a minha incapacidade. É, isso mesmo, FALHEI! Pronto, não consigo, não estou apto, não passei de primeira. Hoje eu quero dizer a vocês que tô caindo fora... É, abandonando o barco legal, serinho, serinho. Mas eu tô saindo numa boa, sem rancor, viu? Só vou terminar essa viagem e de lá eu já volto por terra. Tô pra lá de marejado já, parece que tô a mais de década cruzando o Atlântico e esse velho continente não chega nunca. E nessa brincadeira a gente vai envelhecendo, entendeu? (As três se olham, desistem de escutar e passam a observá-lo de longe) Não é que eu esteja arrependido de tudo, não, até porque eu não conseguiria suportar o fantasma da ingratidão pesando na minha retina. Eu evolui nesse tempo, eu reconheço minhas conquistas, sim. Podem reparar que tô olhando mais pro chão nas saídas e entradas, vê que aquele pequeno abismo já não me pega mais. Quero agradecer a ajuda de vocês, de coração. (Só agora ele se dá conta que as três se afastaram. Elas formam um triângulo de lados iguais em volta dele. Agora a comunição se dá por outra via, tão intensa que faz com que ele se cale. Elas se surpreendem com o silêncio dele. Elas desistem de querer falar, escutar e observar. Cada uma sai da barca por um lado. Ele fica.)

Segui teu conselho, moça

- Oi, Ana. Tô te ligando pra dizer que segui teu conselho.
- Oi, Inês. Tô te ligando pra dizer que não esqueça o meu conselho.
- Oi, Rory. Tô te ligando pra dizer que segui o conselho de uma pessoa e queria que você analisasse.
- Oi, Victor. Tô te ligando pra dizer que Ele te ligou e disse pra você não levar ''nada de valor'' hoje, nem amanhã, sim?
- Oi, tem alguém aí que possa responder por Ele?

ruína diária


4 atores - 4 personagens (Inês; Rory; Ana; Ele)
um espaço em comum - a barca 
encontros e reencontros dessas mesmas pessoas caracterizam a ficção 
a percepção do outro é duvidosa e sedutora. 
há quanto tempo divido esse espaço com essas mesmas pessoas? 
será que são as mesmas?
no meio da dispersão do cotidiano metropolitano o encontro, acaso ou coincidência, necessita de um sentido individual e próprio
o individuo entra num processo de espiral na tentativa de entrar no próprio umbigo 

sábado, 16 de fevereiro de 2013

deixa eu terminar o que tenho pra fazer depois você me fala em liberdade, ok?

- oi. OI! Tem alguém aí? Vocês estão por aí ainda, não estão? (Silêncio) Todo mundo consegue fugir. É engraçado. Inventam logo um lugar melhor pra ir e ainda continuam presentes feito fantasmas. Diferentes caminho pro mesmo lugar. Eu queria era dizer que não há liberdade. Outro dia saindo de casa vi um beija flor ser morto atropelado, sabia? É... Tem quem duvide mesmo. Mas eu vi. E depois, as borboletas ainda foram lá chupar seu sangue. Pra onde será que elas foram depois que quebraram o vidro do carro? Um mundo inteiro lá fora e eu nadando de um lado pro outro sem nenhuma janela decente pra olhar. Sabe, meu camarada, isso não é uma reclamação. É um 360. Esse cara que olha pra tudo como um... Ele veio me falar de liberdade... Ele realmente acha que conta a própria história... Ele realmente acha que escolheu ter entrado aqui, ter olhado pra saia da ruiva baixinha, ter seguido os passos da magrinha. Ele se sente livre. Eu sinto pena. Vê a forma como ele olha pras coisas? Aquele ar de observador, como se só dependesse dele as coisas ganharem um novo rumo. Não, querido! Eu queria contar pra ele da mulher que tentou se jogar da barca, do cara que se envolveu com um amigo e acabou sofrendo por se entregar, contar de um menino criado por uma puta, de um professor que matou a aluna, de um arquiteto sujo de barro, de uma praia que não teve fim, um hamburguer, uma foto antiga de dois amigos no carnaval e depois uma cerveja com os ratos na beira do mar. Mas pra ele não vale o que eu imagino. E ainda vem me falar de liberdade.

existem vários vômitos pela cidade

(para Ele)

- eu poderia ter tomado um outro rumo. minha vida poderia ter sido totalmente outra. era só eu ter dado um passo à direita e não à esquerda, ou ter parado pra olhar o vômito em baixo do muro da minha casa, ou ter deixado de matar a formiga que rondou o meu café da manhã às 10h45 do dia 26 de agosto de 2007. se eu tivesse aceitado, às 20h de 3 meses atrás, provavelmente estaria fudido, perdido, partindo no ônibus hoje às 14h pra bahia, tendo medo da possibilidade de ser completamente idiota no meio de outros tantas milhões de cabeças. se eu tivesse aberto a porta do quarto do hotel às 4h da manhã, dito o que precisava dizer e cagado pra possibilidade de estar beirando a loucura, talvez hoje não estivesse nada sóbrio, vomitando tudo o que visse pela frente, sem úlcera, provável. saudável. sabe a vontade de viver sempre uma outra ficção que não é a sua? era só não ter me esquivado daquela mosca no meio do refeitório às 19h e seguido direto pra saída, esbarrando em você, completamente alucinado. sabe a idiotice infantil de estar sendo seduzido pelo o que te beira e não te toca? ter pegado o salto plataforma e enfiado no olho daquele filha da puta que olhou como se tivesse o direito de olhar. esquecer que seu corpo está onde ele exatamente está porque seu caminho foi trilhado e você nem teve o controle disso. eu poderia ter quebrado o vidro do carro do vizinho em 16 de fevereiro. e seguido para onde?

Fim



mentiras sinceras me interessam

O Amor é o ridiculo da vida.
A gente procura nele uma pureza impossivel, uma pureza que está sempre se ponde, indo embora.
A vida veio e me levou com ela, sorte é ser abandonado e aceitar essa vaga idéia de paraiso que nos percegue, bonita e bela.
Como borboletas que só vivem 24 horas.
Morrer não dói.
(Cazuza)

Posso desabafar com você?

- Claro. Entendi, entendi perfeitamente a situação. Olha, esse é o meu cartão, meu nome é Rory. Você pode ir até o meu consultório com mais calma, a gente conversa e eu penso na proposta de trabalho adequada pra você nesse momento. Lá também eu te esclareço com mais detalhes a minha linha de trabalho... Agora, saindo daqui, procura fazer alguma coisa que você não faz há muito tempo e que te traz alguma satisfação, visitar algum lugar especial, encontrar com alguém que você sente saudade, se desafie em realizar algo inusitado no seu dia hoje. Combinado? Espero sua ligação, viu. Um abraço. Bom dia.

Ele se distrai, cochila e continua na barca depois do desembarque de todos. Ana o acorda, e diz que ele já foi e voltou 4 vezes. Ela oferece ajuda. Senta ao seu lado. Ele tira uma foto dela.

Olha pra mim, moça

- Oi, desculpa te interromper assim no meio da viagem, quero dizer, no meio do seu trabalho. É que eu queria te dizer que eu admiro muito o seu trabalho, a forma como você o conduz da maneira especial como você o conduz, conduz assim de maneira precisa, sem ser afoita, sem querer mostrar que gosta ou que está satisfeita com o que faz, e isso passa pra gente, sabe, eu senti isso, eu tenho certeza que não sou só eu que acho isso, acho nada, percebe mesmo, percebo isso. É... desculpa mais uma vez te atrapalhar, ou te interromper, mas você poderia, se não for encomodo para você, você poderia me dizer no que você pensa quando realiza o seu trabalho? E se não for pedir muito, seu nome, gostaria de saber como você se chama. Só isso, qual é o seu nome?

Ana em momento algum dirige o olhar para ele, e continua seu trabalho sem se abalar. Assim que ele pergunta qual o nome dela, ouve-se um grito. Alvoroço na barca. Inês some.

Me escuta, Inês.

- Olha Inês, lá vem você, você e essa sua mania apaixonante de se despedir de mim com ares de reencontro. Eu te perdoei, sim, sabe porque? Porque a falta que você me fazia era maior que a cicatriz da sua falha. E quem não falha? Fala. Fala alguma coisa. Ou então, tudo bem, não fala, não diz nada, mas me deixa ficar olhando pra você, assim, e ver o oceano da minha voz ecoar na sua cabeça. Seus olhos denunciaram, Inês, eles sempre denunciaram que alguma coisa estava fora da ordem. Mas você muita esperta, Inês - casta, sagrada -, muito inteligente. Eu ficaria aqui, meu desejo era só esse, ficar aqui olhando pra você, muda, casta, imóvel. É interessante como você corre, corre, corre uma maratona sem sair do lugar. Que legal isso. Olha Inês, olha aquela menina que eu te falei ali, ela tá alí ó, olha como ela limpa essas cadeiras, parece um ritual. Olha Inês, eu ficaria aqui contigo, meu desejo era esse, mas tem alguma coisa no processo de trabalho dessa mulher que eu preciso entender. Eu olho pra ela trabalhando e sinto um prazer engraçado, uma sensação de satisfação que arrepia. Eu preciso fazer uma pergunta pra ela. E não precisa ficar preocupada, eu não vou ser invasivo não. Prometo. Já volto. Volto já. Me espera aqui.

Revelação Adormecida

- Deixa eu te dizer uma coisa: VOCÊ É LIVRE!
- Sério? Sério isso? Cara, eu acho que se você não tivesse me lembrado isso eu nunca chegaria a perceber sozinho. Obrigado. Gratidão. 

quarta-feira, 13 de fevereiro de 2013

[Inês - Fernandinha] [Rory - Elisa] [Ana - Ana] [Victor faz todas as personagens masculinas]


Prólogo

Victor está no palco. Sozinho é sempre ansioso. Seus pensamentos precisam de outras personagens para se construir. Ele inventa para dar sentido às coisas como se sua existência dependesse do seu encadeamento de ideias. Acompanha as pessoas. Descreve e dissimula. O prólogo é dado como se estivesse pensando um romance. As meninas entram cada uma de uma vez. Não o escutam.

Rory entra

Victor: Não que isso tenha alguma importância, mas Rory significa cabelos vermelhos e ela nem é ruiva. Talvez seja esse o trunfo da bailarina, pra ela o 'pra sempre' nunca existiu. Ela não tem amarras, não tenta se segurar em nada enquanto cai... Para cair basta estar de pé.

Ana entra

Victor: Mas Ana não. Não tem nada que seja só dela. As vezes até se confunde nas outras pessoas, olha de relance e pensa ter se visto. "Desculpa, achei que fosse eu". Isso é ótimo. "Achei que fosse".
São 40 delas, soltas pela cidade. Duas delas se esbarram no metrô. Quem esbarra não pede desculpa e a esbarrada, sem perdão, joga a outra na frente do trem que vem chegando. Essa situação provocou uma ação em Paris. Fechem as estações com vidros, de modo que somente as portas se abram, quando o trem chegar. São 40 delas, soltas pela cidade. Duas delas se amam durante meia hora. Duas delas se encaixotam no  centro do bairro. Duas delas envolvidas na produção de pães de queijo. Duas delas na venda de mate supervalorizado. Duas, delas, nota-se o pronome ''minha''. Quantas sobram?

Inês entra

Victor: Inês, ali! preciso lembrar, sem falta, são duas da tarde. Eu preciso falar uma coisa que eu tava pensando agora há pouco. Quando ela  terminar o que tem pra fazer, ela responde?

Inês se encaminha para o segundo andar da barca

Victor: Ah... não sobe hoje, não!!!


Cena 1

Victor observa Inês minuciosamente. Cada gesto dela é um roubo de ar dele.
Victor: Uau. Totalmente Circunstancial!

Inês: Oi?

Victor: haha ai ai. Desculpa. Eu costumo nomear meus encontros com mulheres.

Inês: Isso não é um encontro

Victor: Claro que é. Estávamos os dois passando no mesmo lugar na mesma hora. Probabilidade é matemática.

Inês: Achei que encontro fosse química.

Victor: Erro comum.

Inês: Por que Circunstancial?

Victor: Bom, não é programado, nem almejado, sequer manipulado, evidente, preliminar, autoritário...

Inês: Eu achei um pouco autoritário.

Victor:

Inês: Tudo bem. Eu gosto. Quer tomar um café, ó grande mestre dos encontros?

Victor: O que? e mudar o rumo das coisas? Não, a gente tem que se despedir aqui.

Inês: E se eu não quiser?

Victor: Não depende de você. Qual o seu nome?

Inês: Circustância

Victor: Prazer

Victor faz como quem vai beijá-la. Ela enfia os dedos dentro da sua boca e sai. Ana passa limpando as cadeiras.

Victor: Almejado

Analu: Ihhh, ó, dá licença que eu tenho que limpar toda essa parte aí e se eu parar pra ficar de conversinha não consigo terminar e amanhã vai ser duas vezes pior e nada tão ruim como dormir sabendo que amanhã vai ser pior do que hoje.

Victor: Convincente

Analu: Sai

Ana vai para o fundo de cena até sumir sem que lhe percebam. Rory pula em cima do Homem.
Analu: Te pegou, hem?

Rory: Ah, Desculpa! É que você me deu uma vontade de me jogar assim, sabe?

Homem: É... Ok.

Rory: levantando- se:  Pronto.

Homem embasbacado: Nossa! Eu realmente... Nem sei como reagir. Você me surpreendeu mesmo. Uau... (ri) Parabéns.

Rory: Não me leva a mal. É que se eu não faço, não consigo dormir depois. Fico me remoendo, pensando como seria, virando de um lado pro outro, acabo com as minhas unhas, vira uma questão existencial, sabe? É Sério! Nunca teve isso quando deixou de fazer alguma coisa?

Homem: Já, aham. Eu entendo.

Rory: Ufa! Que bom, tchau

Homem: Não, calma! Isso foi muito inesperado Eu não costumo ficar assim, você realmente..

Rory: Olha, eu realmente, só queria pular em você. Agora dá licença.

Homem: Ei! Seu nome, pelo menos.

Rory: Como se isso tivesse alguma importância. Rory. Significa cabelos vermelhos. E eu nem sou ruiva.


Pausa. Saem cada um para um lado.

CENA 2

Analu atravessa o palco ouvindo um discman. Está atravessando pela segunda vez, quando, depois de passar a segunda metade do palco, faz um contratempo com as pernas e dá uma pirueta de jazz. Continua a andar. Inês entra

Ines: que foi isso?
Ana se assusta: ai
Ines com um sorriso: você girou?
Ana: a senhora pode escolher qualquer um dos dois andares para sentar, desde que use o colete.
Ines: sério. você tava dando uma pirueta antes de eu chegar?
Ana: agora com licença, eu vou ajudar os incapacitados

Ana esbarra em Rory que está entrando e sai

Rory: ai, que desastrada. deixei cair meu pensamento

Ines faz um contratempo com as pernas e dá uma pirueta de jazz sorrindo.
Ines sai.
Ele senta e abre um livro.
Victor entra e senta ao lado dela

Rory: Tantos lugares vazios e ele escolhe ao lado da menina que nunca sequer viu.

Ele olha para ela com expressão de que não queria incomodar. Ela sorri.

Rory: Desculpa. Eu gosto de ler em voz alta.

Ele dá de ombros.

Rory continua a ler o livro. Ele a acompanha com assobios, como se quisesse fazer a música da sua fala. Rory fica cada vez mais nervosa e fala cada vez mais alto. Ele acompanha sem alterar sua expressão. No auge de sua irritação, Rory fecha o livro com força, chuta a canela d'Ele e sai emburrada. Ele segura a canela com a cabeça abaixada.
Ana entra.

Ana: Desculpa, o senhor tem que sair

Ele levanta a cabeça e olha para ela, segurando a perna.

Ana: O senhor é incapacitado?

Ele continua encarando

Ana: Não? Então vai ter que sair sozinho. Obrigada.

Ele sai mancando.

Ana se senta na cadeira onde Ele estava sentado, liga o discman e sapateia.

Blackout lento.


CENA 3

A luz acende devagar

Inês deitada no chão com os pés para cima da mesma cadeira onde Ana estava poucos segundos antes. Com calma, engatinha com os dedos para lados opostos, os braços a 90° do corpo. O movimento é lento e se não fosse interrompida, talvez continuasse até os braços se separarem do próprio corpo e serem perdidos de vista cada um para um lado.

sexta-feira, 8 de fevereiro de 2013

para lembrar do beija-flor girando até parar

"Eu li num livro que a probabilidade de um beija-flor morrer esmagado é igual ou menor que a probabilidade de soltar duas pessoas, uma na Índia e outra no Brasil e esperar que elas se esbarrem em algum momento da vida." postagem antiga da padu que não sai da minha cabeça

quinta-feira, 7 de fevereiro de 2013

é bom que se saiba!

Inês entra

Victor: Inês. Ali! preciso lembrar, sem falta, são duas da tarde. Eu preciso falar uma coisa que eu tava pensando agora há pouco. Quando ela  terminar o que tem pra fazer, ela responde?

Inês se encaminha para o segundo andar da barca

Victor: Ah... não sobe hoje, não!!!

Um esbarrão pra acordar.


-  Como você tem coragem de acordar só agora? Lá fora o mundo  explode desde cedo e você aí com esse pijama ridículo do pato Donald. Qual a sua idade? Eu nem preciso saber exatamente para perceber que Pato Donald não dá mais.  Você foi a Disney não foi? Tanto lugar pra escolher e foi logo dançar e cantar com o próprio capitalismo em pessoa! Sabe a porcentagem de analfabetos em nosso país? Isso sem contar com os funcionais e nem adianta me olhar com essa cara e esse  iogurte diet cheio de Aspartame. Sua mãe tentou te ligar sete vezes para te perguntar sobre o natal, mesmo estando em setembro já é preciso pensar em todas aquelas pessoas desconhecidas que temos que nos encontrar pelo menos uma vez ao ano. Aliás o que iremos dizer ao Télio? A filha dele, aquela gordinha que é sua prima ou sobrinha  está com câncer de mama. A culpa foi do Aspartame. O aluguel vence hoje e precisamos  estar as duas em ponto no chá de bebê da Jude. A menina com dezessete anos já engravidou, o outro que mora ao lado já está formado e já empregado aos vinte, tem futuro promissor, aquela lá se apaixonou, casou e terminou tudo isso aos dezenove e você com o Donald e o Câncer. Não que eu queira que engravide agora, mas o tempo está passando e a gente tem essa terrível mania de ir existindo ... um dia acaba. E como quer acabar? Comendo Iogurte que não. O porteiro mandou avisar que precisaremos concertar nossa área com urgência, estamos causando problemas pro vizinho, e por falar nele, se ver um gato preto de manchas brancas por aí é dele. Se perdeu, coitado. Um animal tão pequeno nessa cidade toda não dura muito. A ponte está toda parada. Morreram dois jovens e uma grávida em um acidente. Três mortos e oito feridos. Na verdade foram quatro mortos , porque a grávida... Que horror.  Sabe que horas são? E o seu cachorro preso em casa. Tem almoço na geladeira e é só esquentar no micro-ondas mas não se esqueça de ligar no transformador porque aqui tudo é 120. Micro-ondas mudou, não mudou?  Eu estou me referindo ao acordo ortográfico. Aliás, me responde a uma pergunta: Tudo o que dizemos e escrevemos é apenas um acordo? De quem? Pra quem? E se eu não quiser cumprir ele? Existe multa para quem não acentua as ideias adequadamente?  Quando eu souber para onde vão os ideais inadequados  tudo será resolvido. E quando VOCÊ vai resolver  resolver tudo? Não.  Eu não gaguejei ,os resolveres foram colocados propositalmente com objetivos diferentes. Preste mais a atenção.  Já perdi muito tempo e vou me atrasar para...para...vou me atrasar para  o meu tempo livre e olha que tem muita gente que não tem mais isso.Absurdo,  né?  Isso tudo. Existem pessoas que não tem mais um minuto de descanso e você aí com essa cara amassada.  Cara de pau...devia ter vergonha. E vê se chega cedo, não vai dar bolo outra vez hein? Ah, e por falar em bolo, parabéns. Qualquer coisa é só ligar pra esse número que o aniversário vem pronto, com bolo, vela, pedido e até convidados se quiser. E vê se tira esse Pato Donald...o que os convidados irão pensar?   Só não demora muito porque o relógio,ó, tá sempre correndo e você ,ó, iogurte,pijama, ó, câncer,a gravidez inesperada, a gravidez inesperada com morte inesperada, ó, o acordo....mas , ó , aproveita , tá? É que não é sempre que se faz anos. Ah, bom dia. 

terça-feira, 5 de fevereiro de 2013

bola de neve

- acordo à noite cheia de terra. atravesso os ossos do peito com meus canudos de dedo. no lugar do coração tem um rato que eu deposito na sua frente. as tripas se mexem na pulsação do diafragma, acho que consigo ver o esôfago dele. o rato está mais vivo do que eu, entende? ele sentia uma dor na barriga que não passava e com as unhas coçava o pelo até arranhar a pele. com a ajuda dos dentes abriu um buraco capaz de passar uma agulha, por onde tentou arrancar seus medos com uma pinça que se derreteu em ácido. conseguiu puxar para fora um pedaço do intestino delgado e seguiu puxando em piruetas imprecisas e lindas, como um palhaço chorando que segue cambaleando por entre os trilhos do bonde procurando o melhor lugar para deitar. o palhaço se encontra entre uma casa daltônica e um ponto de ônibus abandonado. lá seria escuro o suficiente para que não percebessem a sua presença. não que alguma vez alguém o tivesse notado. mas esperava que não fosse logo agora, no fim, que fosse visto. não esperava que fosse antes do início o fim que esperava que fosse logo agora tudo o que queria era ser visto, agora, no início de tudo. deitou-se no trilho, os braços para cima em alto lá, uma margarida de plástico na boca. o tempo passou ao contrário por uma eternidade e logo agora seria certeiro no fim do inicio de tudo de tudo início fim nunca certo. o bonde acelerava depois da curva e o palhaço implorava por clemência. Num instante a rua se encheu, o bonde acelerava, amanheceu, as crianças iam para escola, o bonde acelerava, o palhaço conseguia sentir adrenalina pela primeira vez, o bonde tenta desviar, descarrila, passa em cima da mão alto lá do palhaço e se atira contra um caminhão de gás que explode o bonde, uma igreja, 3 cachorros. do meio da fumaça o palhaço surge dançando em mil piruetas. seu grito é seco. suas mãos estendidas a frente do corpo, onde cindo dedos ausentes agora jatos vermelhos de sangue criam círculos no chão. o rato morre finalmente. e eu consigo dormir, entende?

segunda-feira, 4 de fevereiro de 2013

Desfile na hora do rush

Desfile na hora do rush em João Pessoa, Paraíba.

Um senhor, cabelos grisalhos, vende CDs com seu carrinho de mão de som, e se diverte com a trilha do produto, dançando sentado, num vai e vem de cabeça eletrônico. À sua frente, descendo em diagonal, três mulheres, uma delas é o foco, é negra, manuseia seus longos cabelos trançados. Logo atrás das três, também descendo em diagonal e em mesmo número, duas mulheres e um homem sustentam e saboreiam três churros.

Com quantos e quais indícios se dá a cena?


Para Analu