... por mais distraídos que fôssemos, ainda era preciso buscar distrações
fragmentos do trabalho de João Castilho
sexta-feira, 30 de novembro de 2012
Sequências 1 e 2
Sequência 1
Posição inicial: perna direita dobrada a frente e perna esquerda
esticada atrás.
- 8 tempos – alongamento braços a frente.
- 4 tempos – volta para a posição inicial
- 2 tempos – passagem dos braços até a perna esticada para alongar a lateral da coluna.
- 8 tempos – alongamento braços a frente.
- 4 tempos – volta para a posição inicial
- 2 tempos – passagem dos braços até a perna esticada para alongar a lateral da coluna.
- 6 tempos – pausa/ alongamento
- 1 tempo – girar o tronco para frente da perna esquerda.
- 3 tempos – pausa/ alongamento
- 4 tempos – tronco ereto
- 4 tempos – braços no ar, volta para a posição inicial
- 4 tempos – arrastar a perna esquerda, e dobrar em cima da
perna direita.
- 2 tempos – puxar a perna, ajeitar
- 2 tempos – subir os braços, ganhar espaço
- 1 tempo – soltar o braço no chão
- 7 tempos – alongar na frente.
(Transição entre as sequências: 8 tempos com os braços e pernas suspensos)
Posição inicial: sentado, mãos e pés no chão.
- 4 tempos – pausa na posição inicial
- 1 tempo - cabeça cai
- 3 tempos - 1 giro com a cabeça para a direita
- 4 tempos – 2 giros de cabeça
- 4 tempos – descer com o corpo em torção
- 2 tempos – pé direito no chão
- 6 tempos – torção para a esquerda + giro completo
- 8 tempos – levantar perna e torção + barriga no chão
- 2 tempos – barriga para cima
- 2 tempos – barriga para o chão
- 2 tempos – barriga para cima
quinta-feira, 29 de novembro de 2012
quarta-feira, 28 de novembro de 2012
Marrom bem marrom só que lilás
É marrom redondo e pequeno, bem pequeno. De tecido, por isso, na verdade me parece oval mas sei que é um círculo perfeito só que meio dobrado. Com pequenos círculos dentro que na verdade são os "poros" do tecido.
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(O concreto é só o ponto que eu foco? Fiquei realmente na duvida... Só vale o que eu to vendo ou também vale o que imagino? É tão concreto quanto a minha visão embasada pela força de focar num micro ponto. Está impresso num fundo branco/ é um lençol / ao lado dele muitos pontos marrons / distantes de mim próximos entre eles/ ao lado deles / embaixo deles/ grandes flores azuis e folhas verdes / É pra eu só falar do ponto marrom micro ponto marrom, mas minha visão periférica e minha distração me fazem ver todo o entorno / Tudo bem, sem crise... Agora, por exemplo, graças a um irmão dele que encontro bem perto de mim, sei que na verdade ele é lilás. De longe marrom. Mas era assim que eu via.)
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(O concreto é só o ponto que eu foco? Fiquei realmente na duvida... Só vale o que eu to vendo ou também vale o que imagino? É tão concreto quanto a minha visão embasada pela força de focar num micro ponto. Está impresso num fundo branco/ é um lençol / ao lado dele muitos pontos marrons / distantes de mim próximos entre eles/ ao lado deles / embaixo deles/ grandes flores azuis e folhas verdes / É pra eu só falar do ponto marrom micro ponto marrom, mas minha visão periférica e minha distração me fazem ver todo o entorno / Tudo bem, sem crise... Agora, por exemplo, graças a um irmão dele que encontro bem perto de mim, sei que na verdade ele é lilás. De longe marrom. Mas era assim que eu via.)
terça-feira, 27 de novembro de 2012
Primeira tentativa de um primeiro encontro/ Queria não me envergonhar por ter escrito isso.
(Rory se joga em cima de um homem que passa.)
Rory: Ai desculpa é que você me deu uma vontade de me jogar assim.
Homem: É... Ok.
Rory: ( levantado-se) Pronto.
Homem:(embasbacado) Nossa! Eu realmente... Não sei como reagir. Você... Me surpreendeu. É... (ri desconcertado) Parabéns.
Rory: Não me leve a mal. É que se eu não faço, não consigo dormir depois. Fico com essa dúvida de como seria, vira uma questão pra mim. É sério. Você nunca teve isso quando deixou de fazer alguma coisa?
Homem: Já, já... Eu compreendo.
Rory: Que bom. Tchau!
Homem: Espera. É que você é a primeira pessoa a me deixar assim... Sem saber o que fazer. Eu costumo ter resposta pra...
Rory:É... Eu sou uma pessoa de muitas perguntas.
Homem: E não é só isso. É que em determinado momento da vida a gente pensa conhecer todas as possibilidades de aproximação e de repente...
Rory: A gente nunca conhece tudo. Isso é uma conclusão tão óbvia. É interessante, mas acho que já disseram há mais de 2000 anos.“só sei que nada sei.”
Homem: Eu sei. Quer
dizer... É diferente, perceber isso numa situação como essa, tão prática, tão
pequena e ao mesmo tempo... suspensa.
Rory: Olha, eu realmente só queria pular em você.
Homem: Eu sei...
Rory: Que nada sabe agora. Que bom! Me sinto útil.
Homem: É que se você soubesse a vida que eu levo você entenderia...
Rory: Mas que vida hein?! Deve ser horrível essa sensação...
Homem: Como?
Rory: De saber como se portar em qualquer situação, de conhecer todos os tipos de pessoas, tudo perde o sentido né?
Homem: Talvez por isso o seu ato...
Rory: Ai chega! Eu não quero mais teorizar sobre isso. Eu sou movida pelas minhas vontades e isso as vezes é um problema. Não precisamos criar uma relação por causa disso... Você podia ter reagido de qualquer forma. Rolando pela calçada, imitando um cachorro, me jogando pra cima, sei lá... Eu não queria pensar, refletir, só não quis conter essa vontade... Agora com licença.
Homem: Ei! O seu nome pelo menos.
Rory: Como se isso tivesse alguma importância. Rory. Significa cabelos vermelhos e eu nem sou ruiva.
Homem: Não quer saber o meu?
Rory: Não. Tchau! (sai)
segunda-feira, 26 de novembro de 2012
Descrição.
Ponto pequeno de tinta branca dentro de um grande buraco cinza aberto no teto, por infiltração, no canto da copa. Tamanho da ponta de um dedo indicador, do meu dedo indicador. É irregular, centralizado. É o maior dos pontos brancos dentro desse buraco cinza. É foco.
Branco.
Pequeno espaço branco do tamanho de um focinho, com alguns micro pontos mais escuros, deixando o espaço branco com sabor de flocos. Uma mancha, amarelo-ferrugem, suja a parte baixa do espaço branco e dois borrões pretos sujam a parte amarelo ferrugem. Um aspecto soft, fofinho projeta traços transparentes de diferentes extensões para fora da imagem. O ponto não é estático, é bem vulnerável em movimentos e ritmos. A luz e o cheiro também variam. O espaço total se for tirado da imagem real pode ser suportado na ponta dos dedos. Mole. Dentro provavelmente existam raízes. Ramificações rosadas e mortas também serão encontradas, pois o espaço não existe como pedaço. Pedaço branco sabor flocos com manchas amarelo ferrugem com dois pontos pretos e fiapos transparentes não existe, é morto como pedaço de alguma coisa.
(Exercício de descrição da Fe)
(Exercício de descrição da Fe)
domingo, 25 de novembro de 2012
descrição
Entre as leves rachaduras do armário um ponto fosco, enferrujado, marrom e triste. Toda a forma áspera levemente inclinada sai de um buraco apertado e pequeno. A retidão se finaliza com uma ponta afiada e seca. Seria um absurdo imaginar que foi pregado ali, pois sua postura se assemelha a uma raiz forte, concreta e que de lá nunca saiu. Em sua ponta podemos perceber que há mais escuridão. Preto. Grosso. Firme. Leves tons de marrom e prata. As mudanças de tons tem formas irregulares e tais formas existem mais para a esquerda do que para a direita e existem variações de tamanho. As menores se aglomeram quase formando uma só. Na parte pontiaguda o ferro é mais liso do que no resto,porém a aspereza prevalece. Sua sutil inclinação aponta para o chão de um jeito torto. Quase chegando na ponta afiada nota-se um leve risco envolto na horizontal separando o lado reto do pontiagudo formando uma espécie de seta. A ferrugem dá um ar esfumaçado e sujo. As partes pratas entregam os locais não enferrujados que são mais oleosos refletindo a luz.
sábado, 24 de novembro de 2012
só que me desafina
- Oi, tudo bem? Então vou dizer logo, pq se até agora ainda não percebeu eu não vou esperar você terminar as coisas que tem pra cantar antes de me ouvir. Sabe o que é? É que esse caranguejo quer me fazer ficar sentindo tudo, belisca meu peito, meus calcanhares.. me faz me afogar nesse nariz que arde por dentro... É que eu ando em linha reta, entende? Até vc chegar, eu.... Ando tão bem, se vc pudesse me ver.... Mas essa... Roda.... ai, num giro a gente se encontra. Fico sempre tão enjoada... A verdade é que eu fico triste. Talvez vc pense que é raiva, me ache maluca, mas não, é tristeza. meio aguda pra não dizer que é grave. E nessa hora você ri. Só que não. Se você soubesse dos morcegos que moram no meu estomago, das borboletas pretas de asas navalhadas que dançam na minha garganta, da minha língua rocha, inchada. Mas é claro que eu entendo. Isso não acontece com você. É sempre tão bom me encontrar, não é? me sufocar com esses olhinhos. Tá tudo sempre tão bem e você não sabe pq eu fico calada. É que se eu abrir a boca essas borboletas correm e cortam seu peito inteiro, fazendo desenhos vermelhos vibrantes, esguicham, escorrem..... É que se eu abrir a boca eu te bato, bato muito até você estar em algum momento inteiro entregue, nem que seja à dor. Se você soubesse do esgoto. E do Sol que tenta secar todo o lixo, tornar tudo limpo e adubado, esse sol que banha a cabra que me faz querer ser um tempo que ainda não sou, que quer acabar logo com isso, pastar leve e calma... Só que não. Isso é só o que ela diz pra mim. Ela quer é se afundar. É que tb não é violência, veja bem, é libertação... Não é você. É esse muro enorme entre a gente. Você se sente sempre tão perto.... Queria que soubesse das grades. que me tornam louca e vc um daqueles caras de branco, limpos e sóbrios que vem trazer os remédios. E eu a um tempo de abrir a boca. Só que não... é que antes de nascer me decidiram sem tanto da criança que faz as coisas começarem, que agora só me resta girar... É por isso que antes que pare de cantar eu ainda consigo te entender, e não dizer.
quinta-feira, 22 de novembro de 2012
Primeiro dia
Perdoem a menina por não saber dançar
Perdoem a menina por fraquejar, por não conseguir disfarçar a vergonha e por se colocar na posição menina. A perdoem por negar improvisações, não saber o que fazer e por não ter asas na cabeça. É que ela ainda precisa de justificativas e se prende na tentativa inútil de construir o que nem ruína chegou a ser. Talvez, quem sabe, ela um dia irá entender que é preciso abandonar as roupas usadas e mergulhar...no que mesmo? Talvez naquilo que a essa altura seria como dizer se chove ou faz sol. Que bobagem menina...deixe que a mistura do mistério caia de boca no arco íris! É o que dizem por aí.
A menina queria sumir, achou mais razoável vomitar e acabou engolindo.
Perdoem a menina por fraquejar, por não conseguir disfarçar a vergonha e por se colocar na posição menina. A perdoem por negar improvisações, não saber o que fazer e por não ter asas na cabeça. É que ela ainda precisa de justificativas e se prende na tentativa inútil de construir o que nem ruína chegou a ser. Talvez, quem sabe, ela um dia irá entender que é preciso abandonar as roupas usadas e mergulhar...no que mesmo? Talvez naquilo que a essa altura seria como dizer se chove ou faz sol. Que bobagem menina...deixe que a mistura do mistério caia de boca no arco íris! É o que dizem por aí.
A menina queria sumir, achou mais razoável vomitar e acabou engolindo.
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Tentativa de se fazer um diálogo
A- Desculpa. Esbarrei. Desculpa.
B- Você sempre faz isso mesmo.
A- Alguma parte de mim sente prazer.
B- Eu não quero ouvir.
A- É como invadir alguém em poucos segundos e o que sobra é o susto.
B- Eu não quero ouvir.
A- Eu não quero mais falar sobe isso,ok? É que eu queria falar sobre exatamente quando não falamos e você faz isso melhor do que eu.
B- ....
A- Está vendo?
B- Eu tô ocupado.
A- Quando você terminar o que tem pra fazer me responde, ok?
B- Eu tô sempre ocupado.
A- Eu tenho um pouco de tempo pra vender, se quiser me procure.
B- O que?
A- Pra procurar.
B- Perdeu?
A- Desculpa.
B- Você sempre faz isso mesmo.
A- Eu prometo que irei achar. Prometo.
B- Você sempre promete. O que você vai fazer se não achar?
A- Eu vou pedir desculpas.
B- De joelhos? Com a coleira?
A- Aham.
B- Só serve de joelhos.
A- Tá bem, já disse.
B- Você vai lembrar de colocar a coleira?
A-vou.
B- Tá. Então abaixa.
B- Você sempre faz isso mesmo.
A- Alguma parte de mim sente prazer.
B- Eu não quero ouvir.
A- É como invadir alguém em poucos segundos e o que sobra é o susto.
B- Eu não quero ouvir.
A- Eu não quero mais falar sobe isso,ok? É que eu queria falar sobre exatamente quando não falamos e você faz isso melhor do que eu.
B- ....
A- Está vendo?
B- Eu tô ocupado.
A- Quando você terminar o que tem pra fazer me responde, ok?
B- Eu tô sempre ocupado.
A- Eu tenho um pouco de tempo pra vender, se quiser me procure.
B- O que?
A- Pra procurar.
B- Perdeu?
A- Desculpa.
B- Você sempre faz isso mesmo.
A- Eu prometo que irei achar. Prometo.
B- Você sempre promete. O que você vai fazer se não achar?
A- Eu vou pedir desculpas.
B- De joelhos? Com a coleira?
A- Aham.
B- Só serve de joelhos.
A- Tá bem, já disse.
B- Você vai lembrar de colocar a coleira?
A-vou.
B- Tá. Então abaixa.
quarta-feira, 21 de novembro de 2012
Para Elisa:
Você já pensou em casar? E em ter filhos, você já pensou? Já pensou em comprar uma casa, um apartamento, ter uma família e com ela querer mudar o mundo? Você já pensou, ou melhor, parou para pensar - porque tem um puta diferença entre pensar e parar para pensar - na desvalorização do aperto de mãos nos dias de hoje? Eu parei. Parei outro dia para pensar sobre isso. Você já pensou em mudar de sexo?; de nome?; de identidade? E de cidade, já pensou? Já pensou em partir para nunca mais voltar? No dia da sua morte, já pensou? Você pensou, ou melhor, parou para pensar que vestir branco no ano novo é uma questão cultural? Eu já. Parei. Você já pensou como seria a sua vida se ela não fosse aqui? Você já pensou em ser mais feliz do que você é hoje? Já pensou em quebrar tudo, derrubar as paredes e viver sem limitações espaciais? Já pensou em ir morar no campo? E para de fumar? Hein? Já parou para pensar em parar de fumar? Você já pensou em ter uma moto no lugar de um carro? E um patins, já pensou? Já pensou em nadar pelado em uma praia cheia? Eu já. Nadei. Já pensou em ser famoso, fazer muito sucesso, ganhar muito dinheiro e doar toda a sua riqueza para uma ong? Você já pensou em ter uma ong? Eu já. Parei. Parei para pensar. Já pensou em nunca mais usar metáforas ao falar? Já pensou em viver no escuro e somente se alimentar de coisas vivas? Já pensou? Parei. Você já pensou que a distância entre eu e o você nada mais é do que a produção de espaço elaborada por nosso afeto? Eu já. Parei de pensar. Já pensou em comer bombom durante um dia inteiro? Já parou para pensar em responder todas as perguntas que lhe fizerem com uma risada? Parei. Pra pensar.
segunda-feira, 19 de novembro de 2012
sexta-feira, 16 de novembro de 2012
Na época, isso foi agora! E ainda hoje parece nunca ter sido.
2 de abril de 2010
Nas vezes em que não me sou, devo ser ela. Cheguei numa fase de enjoo e desgosto. Que nojo o cheiro doce industrializado das mesmas vozes. Com quantos telefonemas não atendidos se constrói a distância? Estou acostumada a deixar meus amigos para trás. Mas sempre tendo em vista outra coisa. Desta vez estou sozinha, sem ponto de fuga e sem vontade. X viaja em duas semanas para passar 3 meses no Canadá. Y deve se mudar em um mês para a Europa. Queria que eles fossem amanhã. Daqui a pouco eles me esquecem. É só eu continuar não existindo. É isso que tenho feito, aliás. Não existido.
ela
Nas vezes em que não me sou, devo ser ela. Cheguei numa fase de enjoo e desgosto. Que nojo o cheiro doce industrializado das mesmas vozes. Com quantos telefonemas não atendidos se constrói a distância? Estou acostumada a deixar meus amigos para trás. Mas sempre tendo em vista outra coisa. Desta vez estou sozinha, sem ponto de fuga e sem vontade. X viaja em duas semanas para passar 3 meses no Canadá. Y deve se mudar em um mês para a Europa. Queria que eles fossem amanhã. Daqui a pouco eles me esquecem. É só eu continuar não existindo. É isso que tenho feito, aliás. Não existido.
ela
quinta-feira, 15 de novembro de 2012
três tentativas de estabelecer um primeiro encontro
---- tentativa 1
Clementine: Oi.
Joel: Como?
Clementine: Eu só disse oi.
Joel: Oi. Olá. Oi.
Clementine: Posso me sentar mais perto?
(Pausa)
Para onde você está indo?
(Pausa)
Para onde você está indo?
Joel: Rockville Center.
Clementine: Não brinca! Eu também!
Joel: Sério?
Clementine: Que coincidência!
(Pausa)
Clementine: Eu te conheço?
(Pausa)
Clementine: Você faz compras na Barnes and Noble?
Joel: Claro.
Clementine: É isso! Eu já te vi, cara! Sou uma escrava dos
livros há... 5 anos agora.
Joel: Eu teria lembrado de você.
Clementine: Deve ser o cabelo.
Joel: Por quê?
Clementine: Muda muito. A cor. É por isso que pode não ter
me reconhecido. Chama-se Ruína Azul. A cor.
Joel: Entendi.
Clementine: Nome Bacana, né?
Joel: Eu gosto.
Clementine: Essa empresa tem toda uma linha de cores com
nomes bacanas. Ameaça Vermelha. Febre Amarela. Revolução Verde. Seria um bom
emprego, inventar esses nomes.
Joel: Acha mesmo que pode haver um emprego desses? Quantas cores
de cabelo podem existir? 50, talvez?
Clementine: Alguém faz esse trabalho. Agente Laranja. Eu
inventei esse. Coloco minha personalidade numa pasta.
Joel: Duvido muito.
Clementine: Você não me conhece, então não sabe, sabe?
(Pausa)
Joel: Desculpe, só estava tentando ser legal.
Clementine: Tá. Saquei.
---- tentativa 2
Clementine: Meu nome é Clementine, a propósito.
Joel: O meu é Joel.
Clementine: Oi, Joel.
Joel: Oi.
Clementine: Nada de piadas com o meu nome. Ah, não, você não
faria isso. Está tentando ser legal.
Joel: Não conheço nenhuma piada com o seu nome.
Clementine: Dom Pixote.
Joel: Não sei o que é isso.
Clementine: Dom Pixote? Você é maluco?
Joel: Já insinuaram isso.
Clementine: Oh,
querida, oh, querida, Oh, querida Clementina
Você foi embora pra sempre
Mas que pena, Clementina
...Não?
Você foi embora pra sempre
Mas que pena, Clementina
...Não?
Joel: Sinto muito. Mas é um belo nome. É legal. Quer dizer “piedosa”,
não é? Clemência?
Clementine: Mas não se encaixa muito bem. Sou uma vaca
vingativa, verdade seja dita.
Joel: Eu não pensaria isso de você.
Clementine: Por que não pensaria isso de mim?
Joel: Não sei. Eu... Não sei. Eu só... Você parece legal,
então...
Clementine: Ah, então agora eu sou legal? Não conhece outro
adjetivo? Não preciso de “legal”. Não preciso ser legal e não preciso que
outras pessoas sejam legais comigo.
---- tentativa 3
Clementine: Joel? É Joel, não é?
Joel: Isso.
Clementine: Desculpe ter gritado com você. Estou meio destrambelhada
hoje. Devo admitir, constrangida, que gosto muito que você seja legal. Tipo
agora, eu digo. Não sei dizer o que vou gostar de um momento para o outro, mas
bem agora, fico feliz que seja legal.
(Pausa)
Joel: Eu tenho umas coisas que deveria... Estou
escrevendo...
Clementine: Me desculpe!
Joel: Não...
Clementine: Claro. Tudo bem.
Joel: Sabe, isso é... (Leva um soco) Ei!
Clementine: Cuide-se.
Joel: Nossa!
sexta-feira, 9 de novembro de 2012
casa própria ruína
Fonte: http://somostodosintelectuais.wordpress.com/
Cenário de remoções na cidade escrota do Rio de Janeiro.
Onde se especula construções e, inevitavelmente, ruínas.
tô indo mãe, só tenho que terminar de contar esses dias
quando que a memória é encaixotada, selada e arquivada como loucura? eu sou um reflexo do caos? qual o limite do meu corpo? quando eu perdi de vista as pintas e passei a perceber borboletas? espera, isso não era brincadeira? quando começou a ficar sério? quando eu posso parar de querer definir as coisas? quando terminar o que tem pra fazer, me responde, ok?
"Fui até o banheiro atulhado de roupas sujas, a torneira pingando, a cozinha com a pia transbordando pratos e panelas de muitas semanas, a janela de cortinas empoeiradas e o cheiro adocicado do lixo pelos cantos, depois resolvi tomar coragem e ir até o quarto dele. André não estava lá, claro. Apenas as revistas espalhadas pelo chão, a tesoura, as figurinhas entre os cacos dos móveis quebrados. Apanhei a tesoura e comecei a recortar algumas figurinhas. Inventava histórias enquanto recortava, dava-lhes profissões, passados, presentes, futuros era mais difícil, mas dava-lhes também dores e alguns sonhos. Foi então que senti qualquer coisa como uma comichão entre os cabelos. Aproximei-me do espelho, procurei. Era uma borboleta. Das azuis, verifiquei com alegria. Segurei-a entre o polegar e o indicador e soltei-a pela janela. Esvoaçou por alguns segundos, numa hesitação perfeitamente natural, já que nunca antes em sua vida estivera sobre um telhado. Quando percebi isso, subi na janela e alcancei as telhas para aconselhá-la: - É assim mesmo . eu disse. . O mundo fora de minha cabeça tem janelas, telhados, nuvens e aqueles bichos brancos lá embaixo. Sobre eles, não se detenha demasiado, pois correrá o risco de transpassá-los com o olhar ou ver neles o que eles próprios não vêem, e isso seria tão perigoso para ti quanto para mim violar sepulcros seculares, mas, sendo uma borboleta, não será muito difícil evitá-lo: bastará esvoaçar sobre as cabeças, nunca pousar nelas, pois pousando correrás o risco de ser novamente envolvida pelos cabelos e reabsorvida pelos cérebros pantanosos e, se isso for inevitável, por descuido ou aventura, não deverás te torturar demasiado, de nada adiantaria, procura acalmar-te e deslizar pra dentro dos tais cérebros o mais suavemente possível, para não seres triturada pelas arestas dos pensamentos, e tudo é natural, basta não teres medos excessivos. trata-se apenas de preservar o azul das tuas asas."
trecho do conto "Uma história de borboletas", de Caio Fernando Abreu
"Fui até o banheiro atulhado de roupas sujas, a torneira pingando, a cozinha com a pia transbordando pratos e panelas de muitas semanas, a janela de cortinas empoeiradas e o cheiro adocicado do lixo pelos cantos, depois resolvi tomar coragem e ir até o quarto dele. André não estava lá, claro. Apenas as revistas espalhadas pelo chão, a tesoura, as figurinhas entre os cacos dos móveis quebrados. Apanhei a tesoura e comecei a recortar algumas figurinhas. Inventava histórias enquanto recortava, dava-lhes profissões, passados, presentes, futuros era mais difícil, mas dava-lhes também dores e alguns sonhos. Foi então que senti qualquer coisa como uma comichão entre os cabelos. Aproximei-me do espelho, procurei. Era uma borboleta. Das azuis, verifiquei com alegria. Segurei-a entre o polegar e o indicador e soltei-a pela janela. Esvoaçou por alguns segundos, numa hesitação perfeitamente natural, já que nunca antes em sua vida estivera sobre um telhado. Quando percebi isso, subi na janela e alcancei as telhas para aconselhá-la: - É assim mesmo . eu disse. . O mundo fora de minha cabeça tem janelas, telhados, nuvens e aqueles bichos brancos lá embaixo. Sobre eles, não se detenha demasiado, pois correrá o risco de transpassá-los com o olhar ou ver neles o que eles próprios não vêem, e isso seria tão perigoso para ti quanto para mim violar sepulcros seculares, mas, sendo uma borboleta, não será muito difícil evitá-lo: bastará esvoaçar sobre as cabeças, nunca pousar nelas, pois pousando correrás o risco de ser novamente envolvida pelos cabelos e reabsorvida pelos cérebros pantanosos e, se isso for inevitável, por descuido ou aventura, não deverás te torturar demasiado, de nada adiantaria, procura acalmar-te e deslizar pra dentro dos tais cérebros o mais suavemente possível, para não seres triturada pelas arestas dos pensamentos, e tudo é natural, basta não teres medos excessivos. trata-se apenas de preservar o azul das tuas asas."
trecho do conto "Uma história de borboletas", de Caio Fernando Abreu
quinta-feira, 8 de novembro de 2012
Posso te pedir um favor?
Caro primo José,
Sei que há muito não nos falamos, acho que a última vez que nos vimos éramos ainda crianças. Acho que eu deveria ter uns doze anos e você no máximo dez. Consegui seu endereço com a tia Norma. Fiquei feliz ao saber que você conseguiu vencer na vida e que até conquistou seu próprio apartamento aí na cidade grande, como costumávamos dizer.
Soube também que você tem um cargo importante em uma grande empresa multinacional e que ainda por cima encontrou a metade da sua laranja, soube que você se casou. O mais curioso é que escrevo esta carta para um homem bem sucedido, mas quando penso em você vejo aquele menino de dez anos, para mim, na minha mente, não consigo imaginá-lo com seus quase quarenta anos. Quando em penso em você surge aquele menino com o rosto coberto de sardas e calças curtas, sempre suado de tanto que brincávamos e corríamos naquele campinho.
É engraçada essa imagem que formo desse menino vendendo veículos e morando em seu apartamento da cidade grande, todo suado e vestindo um short curtinho. A vida é tão inefável, não é mesmo? É tão imprevisível.
Me lembro que quando crianças costumávamos nos perguntar: O que você vai ser quando crescer?
Engenheiro eletrônico você dizia. Será que você se recorda qual era minha resposta? Astronauta é o que eu dizia que viria a ser. Como é obvio, não sou. Não serei. Tornei-me palhaço. Melhor dizendo a vida me tornou palhaço. Na verdade quando entrei para o circo eu almejava ser trapezista ou quem sabe um artista do escapismo. Mas a natureza não me ajudou, não tenho estrutura física para o trapézio e embora tenha muito fôlego me falta o charme que se tem que ter para um artista escapista. Sou capaz de ficar cinco minutos com a cabeça submersa na água, se você quiser quando nos encontrarmos posso fazer uma demonstração para você. Pode ser até mesmo em um balde cheio de água. Mas. enfim, eles precisavam de um palhaço.
Mas estou me delongando por demais. O motivo dessa carta, um tanto saudosa, é pedir-lhe um favor. O circo acabou, faliu, e eu não tenho para onde ir. Estou em Campinas e permanecerei aqui até o fim deste mês, mas depois pretendo ir a São Paulo em busca de algum trabalho e não tenho onde ficar. Este é o favor que te peço, que dê abrigo para mim e para minha esposa.
Estou casado a poucos meses, me casei com a mulher invisível. Ela também era do circo. Peço abrigo por pouco tempo só até um de nós conseguir um sustento para podermos pagar um aluguel.
Eu não sei o que será da minha vida, será que alguém sabe?
Olga, minha mulher, tem um dom, ela olha para qualquer pessoa e sabe como essa pessoa vai morrer. Mas apesar disso nem ela sabe o que será de sua vida. A propósito, eu morrerei de câncer de intestino, e ela de câncer de estômago. Nascemos um para o outro.
Fico por aqui, se acaso em nome dos bons tempos ou de seu generoso coração, puder me hospedar ligue-me nesse telefone. 0xx19-3213 1234.
É um telefone de recados.
Caro primo, me desculpe o tom saudoso e depressivo desta carta. Vivo um momento de grande angústia, estou muito assustado, quase sem esperanças. Te confesso isso pois quero poupar minha querida esposa, não quero que ela perceba a angústia que amargo. Eu quera ter fé, ou até mesmo um sonho. Eu queria olhar pro futuro e ver algo melhor do que um presente piorado. Queria olhar o presente e não sentir vergonha de mim. Tudo o que desejei se materializou em fracasso. Gostaria de te encontrar apenas para podermos correr naquele velho campinho. Sem preocupações, grandes ou pequenas.
Eu só queria correr, correr, correr...
Muito obrigado.
Saudade,
do seu primo Boris.
P.S. O que você foi quando era criança?
(Prólogo da peça "O que você foi quando era criança?, Lourenço Mutarelli)
quarta-feira, 7 de novembro de 2012
Na época, isso foi ontem! E ainda hoje parece ter sido.
A pouco tempo atrás, cheguei a classificar o enorme esforço feito para ir como "muito barulho por nada". Hoje, tendo acabado de sentir o chão firme de minha terra, fui obrigado a mudar minha opinião. Não pelo acontecimento como um todo mas pelas pessoas e, em especial, por você. Mais uma vez estou sendo obrigado a rever minha vida, tirando dela as histórias que tenho para contar - que gosto de contar. Na volta, conclui que você será mais uma delas. Dessas boas lembranças, que a gente gosta de ter.
Desde pequeno, meu lugar predileto é o aeroporto. Até hoje esse espaço me emociona, trazendo sensações que pouco sei ou procuro explicar. São viagens, chegadas, partidas, encontros, despedidas, muitos beijos, abraços, laços... É o poder de ir e vir que move o ser humano moderno - dono de seus caminhos e decisões.
Pois bem, eu fui! Ou melhor, fomos. A Dóris disse que, na verdade, todos foram só para eu encontrar você. Ela acredita em destino, caminho, essas coisas que dou pouco valor. Talvez eu precise também rever esse meu posicionamento. Me lembro agora que, enquanto eu tomava banho e você me fazia companhia, perguntou se eu acredito em Deus. Acredito, eu respondi. E são por essas situações que passo a acreditar mais. Por esses encontros que são como presentes, surpresas boas, antídotos poderosos para o coração.
Eu voltei, estou aqui, em casa: seguro, cansado, leve e pesado, feliz e saudoso. Já tenho saudade de ti. Uma vez, disse a alguém que minha vida é feita de saudade. Acho que tinha razão. Passamos tão pouco tempo um ao lado do outro que poderíamos julgar todo o ocorrido como loucura. Mas não. Se estivéssemos loucos, teríamos sido extremistas, como você mesmo disse, ou então desmedidos e por ai vai. Mas não. Soubemos respeitar o tempo e, o mais importante de tudo, nos respeitar também.
Eu voltei. e agora sou como uma bolha prestes a explodir de alegria e prazer. Mal sabe, mas foi você a pessoa que me devolveu a crença nas coisas que sempre busquei acreditar: no amor, no romance, no encontro de almas e também na química - como você disse. Não eu não me importo com a sua idade, pois você não tem vergonha dela. Na verdade, foi a partir dela e da lovely que começamos, de fato, a travar o início de uma longa conversa. Digo longa, pois meu corpo, embora sem contato, ainda conversa com o seu. É que foi tão doce que não sei explicar nem traduzir em palavras. A minha barriga é feia, eu disse, e você nem se importou porque o grande barato do momento era saber se eu sentia cócegas ou não. Sim eu sinto. O grande barato foi, e ainda é, ver como você consegue ser enorme em uma cidade tão pequena; Ver como sua beleza se destaca; Ver sua ousadia, seus óculos - para não falar dos seus desenhos. Ah, os seus desenhos. Trouxe um cadinho deles comigo, rabiscados em uma camiseta que deixou de ser comum e jamais ficará velha. Agora ela é uma daquelas camisetas que a gente guarda para sempre, sabe? Aquele tipo de roupa que fica com o cheiro do perfume da pessoa amada. Através dos seus desenhos, lembro-me de seu rosto, olhos, beijo e nariz. Lembro-me também de sua coragem em ter dividido momentos tão importantes comigo. Lembro-me de você ali no restaurante, com as mãos grudadas nas minhas, não se importando mais com os olhares alheios. Você não me deu nenhum beijo hoje - você disse. Eu não soube o que dizer porque todo o tempo que passei sem lhe beijar o fiz em respeito a você. Resolvemos o engano.
Naquela sala de aula, quente, no colchão tropicalista que sim, tens razão, daria um belíssimo casaco de moleton com zíper vermelho. Se um dia você o fizer saiba que será meu mais esta fabulosa peça odente. Como serão minhas também as peças que ainda vou encomendar. Agora que já tenho uma exclusiva, posso ter todas. Preciso dizer também que eu nem sabia que você adora jujuba, mas saindo do banheiro, os pacotinhos gritaram meu nome e eu, sem entender, os levei comigo. Bingo. Era jujuba o que você queria para aliviar aquela premiação para lá de tensa. É que ficou colado em mim o pedaço daquela parede, daquele cantinho, da grama daquele jardim. "Núúúúú", como você mesmo diria, expressando-se com entusiamo. É que ficaram em minha boca os sorrisos que demos, as alegrias que tivemos, o encontro marcado, que sem marcar ou pensar, realizamos. É que ficou na minha cabeça o quão especial foi tudo isso, o quão maduro e exato.
É que saí desesperado do ônibus, correndo pelo prédio da universidade a sua procura - para lhe dar o último beijo, abraço, para olhar seus olhos, talvez, pela última vez. É que sem todas aquelas fotos eu não poderia ir embora. Nós dois ali, mais uma vez, naquela sala e eu falando sobre abstrações do momento, levando as situações para a filosofia. Você poderia ter achado um saco. Mas não. Disse que quando eu falo a imagem que vem a sua cabeça é a de vários livros se abrindo e fazendo aquele barulho do rápido passar entre páginas. Pequenino, eu não sou tão inteligente assim. Eu queria ter dito, mas não consegui. Pois a imagem que fazia de mim naquele momento foi umas das mais belas que já esboçaram.
Sabe o que eu gosto mais em você? É que você quer ver todo mundo crescer, você também disse. Sim isso é verdade, procuro ajudar as pessoas sempre que posso. E procuro também torcer muito pelas que gosto. Mas nesses momentos, eu só tinha olhos para você e todo este entusiasmo que viu em mim, foi você quem gerou. Fui conhecer patos e me deparei com uma girafa, meu animal predileto - bonito, grande, do pescoço e corpo volumosos. Animal charmoso, presente e forte. Mais um para fazer compania a lovely, ao menino coelho e tantos outros bichos que por ai estão a andar, amar, conhecer e viver. É que realmente vivemos esses três dias de uma forma que jamais esquecerei. Agora entendo a força que não sei de onde tirei para me fazer presente nesta viagem, neste festival, neste eventopeçacoração.
Ver você na primeira fileira do teatro foi fabuloso. Ver você me esperando lá fora. Nos ver caminhando, cantando... um brinde, eu sugeri: a nós. É que ainda preciso brindar mais. É que ainda preciso respirar, guardar você direitinho. Já colei na agenda o desejo de feliz dia das crianças; já guardei a blusa que ainda está com o peso de suas mãos; já revi as fotos e quero ver as outras; já contei a alguns e quero dizer mais. Tudo que se vive dessa forma é preciso ser narrado nos mínimos detalhes, que foram muitos. Em breve, lhe mando a foto que pediu e ,junto com ela, minha saudade e carinho.
"Quando a lua apareceu
Ninguém sonhava mais do que eu
Já era tarde
Mas a noite é uma criança distraída
Depois que eu envelhecer
Ninguém precisa mais me dizer
Como é estranho ser humano
Nessas horas de partida..."
RISCADO, Caio. Preciso escrever, preciso do meu computador: eu disse in Casa de Avenca, http://www.casadeavenca.blogspot.com.br/search?updated-min=2009-01-01T00:00:00-08:00&updated-max=2010-01-01T00:00:00-08:00&max-results=42, Rio de Janeiro: 13 de outubro de 2009.
Na época isso foi ontem e ainda hoje parece ter sido...
Era uma meninazinha, menor do que menina, mais miúda do que menininha, quase muda a coitadinha. É que certo dia, na verdade na época isso foi ontem e ainda hoje parece ter sido, ela contava até dez em voz alta, aguda, altíssima para uma meninazinha inha que nem ela e a mãe deu-lhe um tapa na boca. Depois ninguém sabe porque chora tanto nas aulas de matemática. A mãe era matemática, não de ofício, de alma. Exata, numérica, regrada, difícil, calculista, escalena, reta, obtusa. Mas a meninazinha quase muda ainda era feliz. Mesmo detestando matemática podia ser o que quisesse. E brincava de ser tudo, até meninozinho. Um dia a professora viu e deu-lhe um tapa na boca. Depois ninguém sabe porque chora tanto com os meninos. Mas meninazinha continuava feliz, podia ser tanta coisa ainda que fosse menina o tempo todo. Um dia, na verdade na época isso foi ontem e ainda hoje parece ter sido, resolveu ser atriz. Era uma maneira de ser tudo o que queria numa vida só. Contou ao pai, levou um tapa na boca. Depois ninguém sabe porque chora tanto no cinema. A essa altura era a menos meninazinha das irmãs e precisou começar a trabalhar. Empregou-se numa confecção de embalagens plásticas. Doía feito tapa. Mas meninazinha podia ser tanta coisa dentro da cabeça. Um dia inventou de se apaixonar, na verdade na época isso foi ontem e ainda hoje parece ter sido. Contou a uma amiga que deu-lhe um tapa na boca. "Ele não presta" disse enquanto casava com ele na semana seguinte. Outro se apaixonou por meninazinha, quase muda, quase mulher. Disse que não queria, Outro deu-lhe um tapa na boca. Depois ninguém sabe porque chora tanto em casamento. Meninazinha não queria filhos, não gostava do que o mundo fazia com as crianças, após um segundo tapa de Outro engravidou. Depois ninguém sabe porque grávida chora tanto. Um dia, na verdade na época isso foi ontem e ainda hoje parece ter sido, nasceu o filho. Meninazinha quase muda, agora mãe, já não era mais feliz, mas ainda assim não conseguiu odiar aquela coisinha tão pequena, tão miúda, quase muda que nem ela. Amou o filho. Mas quando abriu o berreiro ainda no hospital tratou de dar-lhe um tapa na boca. Ontem mesmo me perguntavam: 'Que diacho de criança é essa que não chora?'
domingo, 4 de novembro de 2012
Leva dore
Por favor não me entenda mal, a gente nem se conhece, mas eu precisava falar algumas coisas que eu comecei a pensar nos últimos minutos. Por favor, fecha a porta do elevador?! As coisas tem o seu ritmo e se ficarem presas por algum tempo... já sabe né? No mínimo, é gritaria depois. Foi isso que eu senti agora. As coisas presas aqui dentro. Dentro da minha boca, da minha casa. Por isso saí até o corredor. Corredor parece que aponta um caminho, né? E te dá a segurança da volta. Mas não é sobre isso que eu quero falar. É que aqui dentro tem coisas que... eu sei que já estão escapulindo pra fora, na minha cara ou no jeito em que estou vestida ou até mesmo nessas almofadas e caixas que não cabem mais lá dentro. Você sabia que o olhar é o que prende? Não que eu queira prender você, mas eu gostaria que você me olhasse enquanto eu falo. Você pode por favor parar um instante de apertar botões? Sua camisa está ótima, o celular está fora de área e o elevador não vai subir agora, porque sempre que precisamos muito de alguma coisa ela demora, porque já passamos na frente dela, entende? Isso me lembrou que quando pequena minha mãe pediu para eu chamar o elevador enquanto ela terminava de fazer alguma coisa que os adultos fazem antes de sair, lembro que parei em frente a porta e comecei a gritar " LEVADORE, LEVADORE".
Espera! Não abra a porta. Talvez a luz aí de dentro me faça esquecer tudo, ou me leve para outro lugar. Igual a um sonho que qualquer ação modifica o resto. Sem deixar marcas de quem você era antes, sabe? Você reconhece em você alguma marca do que você era? Do que você era antes de alguma coisa? Antes do que você é agora? Antes de abrir essa porta pela primeira vez? De alguma forma eu tenho marcas em mim do que você era. De quando você estava mais dentro. Bom, eu espero. Sentada nas minhas almofadas que não me cabem mais. Mas não era sobre isso que eu ia falar. Quanto tempo passou depois dos últimos minutos? Quando você terminar o que tem pra fazer você me responde, ok?
Por favor não me entenda mal, a gente nem se conhece, mas eu precisava falar algumas coisas que eu comecei a pensar nos últimos minutos. Por favor, fecha a porta do elevador?! As coisas tem o seu ritmo e se ficarem presas por algum tempo... já sabe né? No mínimo, é gritaria depois. Foi isso que eu senti agora. As coisas presas aqui dentro. Dentro da minha boca, da minha casa. Por isso saí até o corredor. Corredor parece que aponta um caminho, né? E te dá a segurança da volta. Mas não é sobre isso que eu quero falar. É que aqui dentro tem coisas que... eu sei que já estão escapulindo pra fora, na minha cara ou no jeito em que estou vestida ou até mesmo nessas almofadas e caixas que não cabem mais lá dentro. Você sabia que o olhar é o que prende? Não que eu queira prender você, mas eu gostaria que você me olhasse enquanto eu falo. Você pode por favor parar um instante de apertar botões? Sua camisa está ótima, o celular está fora de área e o elevador não vai subir agora, porque sempre que precisamos muito de alguma coisa ela demora, porque já passamos na frente dela, entende? Isso me lembrou que quando pequena minha mãe pediu para eu chamar o elevador enquanto ela terminava de fazer alguma coisa que os adultos fazem antes de sair, lembro que parei em frente a porta e comecei a gritar " LEVADORE, LEVADORE".
Espera! Não abra a porta. Talvez a luz aí de dentro me faça esquecer tudo, ou me leve para outro lugar. Igual a um sonho que qualquer ação modifica o resto. Sem deixar marcas de quem você era antes, sabe? Você reconhece em você alguma marca do que você era? Do que você era antes de alguma coisa? Antes do que você é agora? Antes de abrir essa porta pela primeira vez? De alguma forma eu tenho marcas em mim do que você era. De quando você estava mais dentro. Bom, eu espero. Sentada nas minhas almofadas que não me cabem mais. Mas não era sobre isso que eu ia falar. Quanto tempo passou depois dos últimos minutos? Quando você terminar o que tem pra fazer você me responde, ok?
Um palpite de ruína a qualquer hora
A barca é da antiga e atrasou um minuto para desligar-se de Niterói. Ela gira para seguir destino, deixando o rastro no caminho, que risca o mar preto com a espuma branca e o céu branco com a fumaça preta. Tudo nela conduz ao passado; das cadeiras azuis ''reformadas'' com os braços de madeira, que, descascando, denunciam a ruína, até as janelas guilhotinas, tão generosas com a brisa que invade. Olho pro lado esquerdo e... ruína (no campus da UFF no Gragoatá). Coletes laranjas no alto. É proibido fumar.
Seu design 3542 vem de Nova Orleans, USA, em 1950. Uma cidade que já virou ruína tem uma construção viva, nadando na baia de cá.
Por maiores que sejam os indícios de ruína revelados, ela me acolhe muito mais que sua irmã mais nova.
Sou levado a crer que há construções nada construtivas e ruínas pouco arruinadas.
Descabelado estou.
Seu design 3542 vem de Nova Orleans, USA, em 1950. Uma cidade que já virou ruína tem uma construção viva, nadando na baia de cá.
Por maiores que sejam os indícios de ruína revelados, ela me acolhe muito mais que sua irmã mais nova.
Sou levado a crer que há construções nada construtivas e ruínas pouco arruinadas.
Descabelado estou.
sábado, 3 de novembro de 2012
Em algum lugar debaixo da poeira
Consta que:
nasceu ANA LUZIA ALVES CHAVES.: do sexo feminino.: de cor :..:
nascido(a) à Hospital Santa Mônica, Niterói .:
no dia dois (2) de janeiro de 1992.: às 20 .: horas e 15.: minutos
sexta-feira, 2 de novembro de 2012
Brincadeira
Aqui tudo parece que era ainda construção e já é ruína. Aqui tudo parece que é ainda construção e já era ruína. Aqui tudo aparece na construção e não é só ruína. Aqui tudo aparece pra fora da construção e só ruína. Aqui tudo parece que era ainda construção de ruína e já é pó. Aqui tudo aparece, parece, desaparece e some. E por mais distraídos que fôssemos, ainda era preciso buscar distrações. E por mais atraídos que estivéssemos, ainda era preciso buscar traições. E por mais movimentados, atentos e dispostos, só saltava mesmo a busca distraída, despretensiosa, mas pretendida. Pretendemos. Construção e ruína. Angústia boa... Fica o que significa?
quinta-feira, 1 de novembro de 2012
alô, alô!! Wanda? E agora, como é que eu faço?
Eu quis tentar desistir em nome de um projeto. Quero dizer aqui que eu tinha um projeto! Era lindo!! Era tranquilo, o tempo, os pássaros, os amigos e eu mesma...! Ele era mesmo meu objeto de adoração e devo dizer que todas as minhas dores viravam suspiros quando eu lembrava dele!! Tocava até uma música!! Era lindo... era um projeto e eu sabia que... O mar... Eu nadava no mar. Sem parar eu nadava. E o projeto crescia e flutuava!! Por cima dos prédios e arranha-céus as folhas voavam... Gente!! Olha aqui!! Vem cá ver como ia ser lindo!!! Iam ter até cores!! Muitas cores! O que eu quero dizer com isso é que eu tinha um projeto!! E fui até Wanda, convicta de que seria o melhor pra todos. Eu me afastaria assim não tão afastada mas me afastaria para afinal deixar vocês com suas ruínas e eu com meu enorme projeto de lego colorido e flutuante. E ela me disse que esse projeto não existia. É mole? Agora mais essa! Que pra construir não existe projeto, pra construir existe o presente. E nunca se sabe como as coisas vão terminar... Acreditar num projeto é uma escolha medíocre, ela disse... O pior é que ela sabe que eu nasci pra projetar!! Essa é a unica coisa que sei fazer na vida! Passear pelos tempos.. Porra, Wanda, você sabe!!! eu disse. A Wanda me chamou de medíocre e o pior é que eu concordei. Projetar é ruína. É pisar na ruína pra dizer que ali vai existir... Já existe, só existe. Agora não dá mais tempo. É, Wanda... Estou aqui. Já enxergo os pedaços, os cabelos, as borboletas, as orações... Mas se o concreto me tira tanto, e você me tira o meu projeto... Pra onde eu vou?
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Ryan Mcginley
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